Na noite da última sexta-feira (3), o Plenarinho da Câmara Municipal do Rio Grande ficou lotado ao receber a audiência pública sobre a Revisão do Plano de Manejo de Dunas – documento necessário para a licença de uso de faixa de praia, emitida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).
A polêmica sobre o assunto começou no início de fevereiro, quando o Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (Nema) e o Executivo Municipal realizaram duas reuniões com a comunidade para apresentar e debater a revisão do Plano de Manejo de Dunas.
Dessa revisão, surgiu uma condicionante que divide opiniões: a implantação de uma faixa de exclusão de veículos entre as ruas Rio de Janeiro e Pelotas, na praia do Cassino. Durante as reuniões, muitos se mostraram contra a proibição de veículos, mesmo que seja em apenas 800m de praia – que é o que diz o projeto. Devido à polêmica, o vereador Julio Cesar (PMDB) propôs a realização da audiência pública.
MESA
Às 18h30min – horário marcado para início da audiência – já não havia mais cadeiras vagas para o público, o evento acabou iniciando com 30 minutos de atraso e seguiu até as 22h. E nessas três horas – marcadas por muita politicagem velada – tanto o público quando os convidados da mesa tiveram que se apertar para caber no Plenarinho.
Foram convidados a fazer parte da mesa: o analista ambiental e gerente regional da Fepam, Paulo Duarte; o professor do PPG em Gerenciamento Costeiro da Furg, Ícaro Cunha; o superintendente regional da Corsan, Eduardo Guimarães; o oceanólogo e professor aposentado da Furg, Norton Gianuca; representando o Executivo Municipal, o secretário de Município do Meio Ambiente, Eduardo Morrone; e o presidente da CDL, Luiz Carlos Zanetti.
Já no início da audiência, logo após serem chamadas as autoridades para participarem da mesa, o proponente da audiência, vereador Julio Cesar, abriu a audiência reclamando da ausência do prefeito Alexandre Lindenmeyer e indagando sobre a validade da presença de seu representante, o secretário do Meio Ambiente Eduardo Morrone, devido ao fato de o mesmo não ser rio-grandino. Além das críticas políticas, o vereador proponente se mostrou contra a proibição dos veículos em um trecho da praia, pois descaracterizaria o balneário e traria prejuízos à acessibilidade dos veranistas.
Julio Cesar também colocou em xeque a validade da legislação estadual, no caso a Lei nº 9.204, de 11 de janeiro de 1991, que proíbe a circulação de veículos nas praias balneárias do Estado do Rio Grande do Sul. Ainda, questionou a competência regional da Fepam, representada ali por Paulo Duarte, ao dizer que a superintendência não teria o poder de fazer tal exigência – da criação de um trecho sem veículos – e perguntou, ainda, onde estaria escrita essa condição para a liberação da licença, uma vez que ele nunca tinha visto este documento.
ONDE ESTÁ O NEMA?
O secretário Eduardo Morrone, durante sua fala, rebateu a crítica de Julio Cesar e explicou que, por ser natural de Santa Vitória do Palmar, sempre esteve inserido na mesma região e que conhece muito bem a cidade e o balneário Cassino. Morrone também reclamou de uma ausência, a representante do Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (Nema), justamente a entidade responsável pelo tão polêmico Plano de Manejo de Dunas.
Ao perceber a falta, o presidente da Casa Legislativa, vereador Charles Saraiva (PMDB), pediu desculpas e convidou Renato Carvalho, coordenador do Projeto Dunas Costeiras do Nema, para participar da mesa. Como não havia mais espaço, o vereador Flávio Maciel (SD) cedeu seu lugar para Carvalho. O convite ao representante do Nema foi muito aplaudido pelos presentes.
Carvalho explicou brevemente sobre o plano e as licenças da Fepam e salientou que o projeto não deve ser encarado como a exclusão de veículos e sim como a inclusão de pessoas em uma área de lazer sem veículos. “Para a Prefeitura poder trabalhar nas ruas do Cassino, poder limpar arroio, abrir rua, liberar a avenida Beira Mar, ela precisa de uma licença da Fepam e para essa licença uma condicionante é a apresentação gradativa de áreas de exclusão […] sobre a mobilidade, acredito que o corpo técnico de Rio Grande tenha como planejar a ação para uma área fechada de apenas 800m, afinal, serão 20km para uso de veículos”, disse.
AUTORIDADES
Paulo Duarte se manteve com poucas palavras, refutando apenas a fala de Julio Cesar sobre a competência da regional da Fepam, “todas as licenças são públicas a todos e a regional analisa, sim, as licenças, as decisões são feitas por nós, em consonância com a sede de Porto Alegre”, disse Duarte.
O professor Ícaro Cunha se mostrou favorável às mudanças. “As pessoas se adaptam à falta de acessibilidade, à dificuldade de acesso, as pessoas utilizariam a praia da maneira como fazem hoje, quem vai de carro iria de carro e quem vai a pé, vai a pé […] com a faixa de exclusão, se conseguiria um dia tranquilo, se conseguiria contemplar a natureza, afinal a democracia não é poder estacionar na praia, é muito mais ampla do que isso. E isso iria agregar valor à nossa praia e evidenciar outros atributos de lazer”.
Já o professor Norton Gianuca ressaltou que não foram feitos os estudos do impacto que isso iria causar e que a mudança não traria tantos benefícios ambientais. “As aves migratórias não são prejudicadas com o trânsito e sim com as mudanças climáticas […] do Molhe Oeste até o Navio Altair são 21km, que devem, sim, ser cuidadosamente manejados pelo Município, mas o que se propõe deveria ser uma faixa total de exclusão a partir do Navio e até o Chuí”, ressaltou.
O superintendente regional da Corsan, Eduardo Guimarães, e o presidente da CDL, Luiz Carlos Zanetti, se mostraram contra a criação da faixa de exclusão de veículos. Guimarães levou em consideração o alto investimento que seria necessário para criação de estacionamentos na avenida Beira Mar e Zanetti disse que isso “pode ser o fim da praia do Cassino”.
PÚBLICO
As manifestações do público presente foram muitas, mesmo os que não pediam o microfone, de formas polidas ou não, com gritos ou aplausos, ações – segundo o presidente da Casa, proibidas em audiências públicas – conseguiam expressar sua opinião.
Adalberto Pereira mostrou-se preocupado com a criação da faixa. “Meu posicionamento é de preocupação com o momento em que estamos, já perdemos o Polo Naval e agora querem causar mais esse problema na praia do Cassino, agora são 800m, mas daqui a pouco são mais 800m”, ponderou.
O chefe da Esec Taim, o oceanólogo Henrique Horn Ilha, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) também pediu a palavra e explicou sobre o monitoramento que foi feito na praia do Cassino, sobre o impacto ambiental – que durante a audiência foi citado como um estudo com resultados não conhecidos – e entregou o relatório ao presidente da Casa.
O estudante Ricardo disse não ver problemas de acesso com a criação da faixa. “Quem quiser ir para os Molhes vai, quem quer ir para o outro lado também vai ter acesso, isso não vai atrapalhar o comércio de maneira alguma e vai dar mais segurança para quem estiver nesse lugar, ou vocês não lembram mais que, no dia 23 de fevereiro, um senhor morreu atropelado na praia e a esposa dele ainda está hospitalizada”, disse.
PESQUISA NO SITE DO AGORA
Em fevereiro, a enquete do site do Jornal Agora focou no tema e perguntou aos leitores: “A polêmica criação de uma faixa, com cerca de 800m, de exclusão de veículos na praia do Cassino entre as ruas Rio de Janeiro e Pelotas vem dividindo opiniões. O Agora quer saber qual é a sua posição”.
O resultado, até a noite de ontem (5), estava em 53.32% – Sou a favor da criação da faixa; 31.68% – Sou contra a criação da faixa; e, 14.99% – Penso que a criação da faixa deveria ser mais debatida com a comunidade.
Lembrando que o resultado dessa enquete não tem valor de amostragem científica e se refere apenas a um grupo de leitores do Agora.
Por Esther Louro